Found Footage


O ano de 1999 foi um ótimo ano para o Cinema. Naquele ano tivemos Clube da Luta, Matrix, Magnólia, Beleza Americana, O Gigante de Ferro, O Sexto Sentido e vários outros filmes. Mas naquele ano nenhum outro chamou tanto a atenção e aguçou a curiosidade da pessoas quanto o assustador, terrível, apavorante e perturbador A Bruxa de Blair (The Blair Witch Project no original). O filme de orçamento irrisório é um dos mais lucrativos da história do cinema. O filme mostrava a história de um trio de estudantes de cinema que decidem filmar um documentário sobre a bruxa como trabalho de conclusão de curso. Pra filmar o documentário o trio adentrou a floresta onde a bruxa fazia suas vítimas. Os jovens jamais foram vistos de novo. Apenas as fitas foram encontradas. O conteúdo perturbador das tais fitas e o registro dos últimos dias de vida do trio foram exibidos nos cinemas do mundo inteiro. A grande jogada é que todos que foram ao cinema pensavam estar vendo uma história real. O filme foi vendido como sendo real e até hoje ainda é possível encontrar pessoas que acreditam veemente nisso. Com o sucesso de A Bruxa de Blair outros filmes foram lançados nos mesmos moldes. A este tipo de produção chama-se found footage. É bem verdade que A Bruxa de Blair foi para a época bastante inovador e o marketing fez um excelente trabalho. Os atores do filme, que interpretavam a si mesmos, tiveram de ficar vários meses escondidos para simular que estavam mesmo desaparecidos/mortos. Os familiares foram cumplices. Vários programas de tv queriam entrevista-los a respeito e eles se fazendo de abalados demais pra falar. Algumas semanas antes da estreia do longa foi exibido na tv um outro documentário a respeito da terrível bruxa. Curiosidade do povo em ver o filme chegou a um nível tão alto que as salas lotaram várias sessões. Meses depois a história foi desmentida e os atores do filme puderam reaparecer, afinal todos os amigos pensavam mesmo que o trio tinha batido as botas. Revendo hoje o filme não tem como achá-lo assustador nem nada, mas a época em que foi lançando A Bruxa de Blair a gente assistia o filme de modo meio paranoico, olhando os arbustos ou qualquer sombra que eventualmente pudesse surgir. O terror era puramente psicológico, até porque pouca coisa acontece. O sucesso garantiu ao filme uma continuação muito ruim chamada A Bruxa de Blair 2: O Livro das Sombras e um terceiro filme está nos planos dos produtores já tem um tempo. Se a terceira parte vai ou não sair do papel é algo que só o tempo vai dizer. Mas o que realmente importa é que o primeiro filme foi o responsável por popularizar o estilo found footage, além de ser alvo de vários estudos e dissertações a respeito tanto na área do marketing quanto do Cinema. Mas se engana quem pensa que A Bruxa de Blair foi o primeiro filme a usar a técnica.

Alguns anos antes, mais precisamente 19 anos, foi lançado nos cinemas mundiais um filme polêmico, pesado e que fez muita gente passar mal. É claro que estou falando de Holocausto Canibal (Cannibal Holocaust). O filme dirigido pelo italiano Roggero Deodato e mostrava um grupo de documentaristas que foram a Amozônia registrar as tribos indígenas que ali vivem. Depois que eles não voltaram e nem mesmo deram notícias um antropólogo vai atrás do grupo encontrando apenas os filmes em rolo de película. Quando assiste as gravações é então revelado o que aconteceu aos documentaristas. O filme é bem gráfico e chama a atenção pela crueldade das cenas, com direito a violência sexual e empalamento. O filme, diferente de A Bruxa de Blair, foi vendido como uma obra de ficção, mas foi tão bem realizado que ficou parecendo que tudo era real e o diretor foi acusado de ter realmente matado os atores do filme no processo de filmagem. Para desmentir o rumor Deodato e o elenco vieram a público pra provar que todos estavam vivos. Ainda assim o filme foi proibido de ser exibido em diversos países, inclusive na Itália onde Deodato chegou a ser preso acusado que seu filme promovia obscenidades. Como se não fosse polêmica suficiente pra um filme só, o diretor foi alvo de várias críticas por, durante a gravação das cenas, ter realmente matado pelo menos seis animais.

Outro filme que usa muito bem o recurso de found footage é REC, um filme de terror espanhol lançado em 2007 que mistura epidemia zumbi com possessão demoníaca. O filme, dirigido por Jaume Balagueró e Paco Plaza, mostra uma repórter chamada Angela Vidal (Manuela Velasco) e seu cameraman Pablo (Pablo Rosso) que acompanham uma noite uma equipe do corpo de bombeiros para mostrar como é o cotidiano de quem trabalha de madrugada enquanto as pessoas dormem em suas casas. Os bombeiros são enviados a um prédio. O problema começa quando alguns moradores do prédio se tornam zumbis e passam a atacar os outros moradores, os bombeiros, a repórter e seu cameraman. Quando tentam deixar o prédio descobrem que o mesmo foi lacrado e que eles estão em quarentena, sendo obrigados a permanecer em seu interior com os zumbis. Tudo o que acontece é filmado pela câmera de Pablo. Depois é revelado que a zumbificação é o resultado de um vírus demoníaco criado em um laboratório secreto no prédio. O criador, um padre, tentava unir ciência e religião e resolveu criar uma vacina científica para uma possessão ao invés de realizar um exorcismo, como mandava o manual. Ao invés de uma cura, criou uma doença onde a contágio-possessão é transmitida através de mordidas da pessoa infectada. É algo bem original. Eu mesmo nunca tinha visto nada igual antes. O filme é sucesso de crítica e é considerado um dos melhores filmes do gênero terror da década passada. O filme tem umas tomadas longas que são bem interessantes e consegue criar bem a atmosfera de medo necessária. A ausência de trilha sonora e a excelente mixagem e edição de som tornam tudo muito realístico. O filme ganhou um desnecessário remake hollywoodiano chamado Quarentena e teve ainda outras três sequências: REC 2: Possuídos, REC 3: Gênesis e REC: Apocalipse. Infelizmente nenhuma das continuações fez juz ao original.

Quer chamar a minha atenção para algum projeto? Diga que J.J. Abrams está envolvido nele. Desde o seriado Lost eu não perco nada que tenha o dedo de Abrams, não é a toa que fiquei animado quando o confirmaram na direção de Star Wars VII. Em 2008 seria lançado o novo longa produzido por ele, Cloverfield. Mas o que era Cloverfield? Ninguém sabia. A história do filme foi mantida em sigilo. Abrams soltava algumas pistas na internet e o pessoal tentava decifrar, o que levava a um site, a um trecho de vídeo e assim foi. O poster mostrava a Estátua da Liberdade decapitada e eu continuava sem saber o que seria Cloverfield, só sabia que eu queria ver e pronto. Um dia eu tava no cinema, não lembro qual filme fui assistir, e começou a rolar um trailer que mostrava um pessoalzinho numa festa de despedida e daí tinha um terremoto seguido de um barulho desconhecido, o pessoalzinho subia ao telhado do prédio pra ver alguma coisa e de repente uma explosão com vários destroços voando na direção deles. Quando saiam desesperados para a rua... Bam! A cabeça da droga da Estátua da Liberdade que estava ausente no poster cai bem na frente deles. Corta pro nome do filme. Cloverfield - Monstro (pois é, o filme recebeu esse sub-título no Brasil, supostamente porque não entederiamos por conta própria que se tratava de um monstro e por isso era melhor da spoiler no trailer do que nos deixar descobrir nós mesmos o que era que estava acontecendo). Ah! Ia me esquecendo, tudo filmado com uma câmera de mão, O filme tem uma sacada interessante no desenvolvimento do roteiro que tudo é filmado por cima de um vídeo já existente, então a gravação as vezes falha e vemos trechos do vídeo original, que nos dá a base para os eventos que estavam acontecendo na festa eliminando assim o didatismo de alguém ter de nos situar na situação. Pense nesse filme como sendo o cruzamento de A Bruxa de Blair com Godzilla. O filme teve a direção de Matt Rheeves, que recentemente dirigiu Planeta dos Macacos: O Confronto.

Mas quem pensa que o found footage só da pra ser aplicado em filmes de terror se engana feio. Em 2012 Josh Trank, diretor do vindouro reboot do Quarteto Fantástico, nos trouxe Poder Sem Limites (Chronicle no original), um filme de super-herói (?) bem interessante. Na história três adolescentes adquirem poderes telecinéticos após entrarem em contato com um estranho objeto desconhecido encontrado em um buraco. No começo eles limitam-se a usar seus poderes para pregar algumas peças. Mas quando um deles, Andrew (interpretado pelo competente Dane DeHaan), vai se tornando cada vez mais cruel e inconsequente, um reflexo de anos de bullying sofrido e uma convivência com um pai alccolátra e violento, acaba usando seus poderes para o mal. Responsável pela morte de um de seus amigos (Michael B. Jordan), Andrew vai se tornando cada vez mais distante de seu primo Matt (Alex Russell). Na tentativa de um assalto para conseguir o dinheiro pra comprar os remédios pra mãe Andrew provoca um acidente, uma explosão, que o deixa ferido. Enfurecido e perseguido pela polícia Andrew ameaça destruir a cidade com seus poderes cabendo a Matt a tentativa de parar o primo. Filmado quase totalmente pela câmera de mão de Andrew, o filme faz uso de imagens de câmera de segurança e até mesmo de celular para captar a história narrada. O filme além de revelar Trank como diretor, ainda lançou DeHaan e Jordan ao estrelato. Uma sequência está nos planos do estúdio. Eu torço para que não aconteça.

Vários outros filmes pegaram carona no estilo que é cada vez mais popular. Apesar que com o tempo o found tem sido usado com menos frequência, pois a filmes em que os vídeos são apenas uma questão de ponto de vista como na (superestimada) comédia Projeto X, que acaba por se tornar outro sub-gênero chamado mocumentário (um documentário onde os fatos apresentados são todos ficcionais). Outros seguem a linha do registro das imagens como um registro mais documental mesmo, vide a franquia Atividade Paranormal (que não citei acima, mas que é um dos maiores representantes recentes deste tipo de filme). Alguns são bem toscos, como é o caso de Projeto Dinossauro. Outros são interessantes como o nacional Desaparecidos, que é um filme que peca por falta de criatividade e emula outros do gênero como REC. Outro ruim também é o Apollo 18. A proposta foi até interessante, mas execução deixou muito a desejar. Houve um projeto em Hollywood uns tempos atrás pra fazer um novo Sexta-Feira 13 nesses moldes. Já imaginou Jason em found footage? Seria bem estranho. O que podemos constatar é que desde a popularização com A Bruxa de Blair o gênero cresceu e se expandiu e continua a se expandir para vários mercados. Eu sou fã de um bom found footage e quero é me divertir assistindo bons filmes. Você me recomenda algum?



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